“TÃO NECESSÁRIOS UM AO OUTRO COMO HOMEM E MULHER”: REPRESENTAÇÕES DO JAPÃO E COREIA EM COREA, THE HERMIT NATION (1911), por Emannuel Henrich Reichert

 


Em uma oportunidade anterior, analisei um capítulo pouco conhecido da história do conceito de orientalismo, mostrando que algumas das críticas centrais elaboradas por Edward Said estavam prefiguradas em um artigo de 1912 do religioso e orientalista americano William Elliot Griffis [Reichert, 2021]. No conciso “A literary legend: “The oriental”” (“Uma lenda literária: “O oriental””), Griffis demonstra consciência do oriental como um estereótipo inventado, os interesses financeiros em promovê-lo e as desigualdades de gênero envolvidas, embora não se ocupe da relação saber-poder entre o conhecimento produzido pelos orientalistas “sérios” e o imperialismo contemporâneo. Agora verificarei se o próprio Griffis aplicou na prática suas conclusões teóricas. O objeto de análise será a forma como ele representou o Japão e a Coreia na edição de 1911 do seu livro Corea, the hermit nation (Coreia, a nação eremita).

 

A realidade “por trás” das representações receberá menções en passant, sem ser o foco. O objetivo não é investigar se as observações do livro estão mais ou menos corretas, pois não há uma correspondência unívoca entre fatos e representações. Uma mesma realidade pode ser objeto das interpretações mais díspares, cada uma elaborada a partir de um certo ponto de vista, formada por filtros, seleções, ênfases, esquecimentos e juízos de valor voluntários e involuntários.

 

A relação entre Japão e Coreia no final do século 19 e início do 20 é de particular interesse por ser um caso de imperialismo em que os dois envolvidos, metrópole e colônia, eram países asiáticos. A dominação japonesa sobre a Coreia seguiu moldes semelhantes à expansão colonial de países ocidentais: o uso da diplomacia de canhoneiras para abrir os portos coreanos em 1876, influência política e econômica crescentes, guerras contra China e Rússia por influência na região, o estabelecimento de um protetorado em 1905 e, finalmente, a anexação em 1910. A semelhança não é coincidência; o Japão Meiji adotou as práticas imperialistas então em voga da mesma forma que importou e adaptou outras instituições do Ocidente [Duus, 1995, p. 11-12].

 

Griffis (1843-1928) trabalhou como professor no Japão no início da década de 1870. Foi um de numerosos estrangeiros contratados pelo governo Meiji para trazer ao Japão a tecnologia e instituições de modelo ocidental necessários para preservar a independência em um cenário internacional desfavorável [Hirakawa, 1989, p. 466]. De volta aos Estados Unidos, tornou-se pastor e combinou a atividade religiosa com um grande volume de escritos e palestras voltados a promover o conhecimento do Japão e dos japoneses [Ota, 2023, p. 17-18]. Sua obra principal foi The mikado´s empire (O império do micado), misto de história japonesa e observações pessoais, publicado em 1876 e reeditado sucessivas vezes com o acréscimo de novos capítulos acerca dos acontecimentos mais recentes.

 

O interesse de Griffis pela Coreia, segundo ele conta, começou enquanto morava no Japão e visitou Tsuruga, antigo local de contato entre os dois países, onde “enviados coreanos desembarcavam a caminho da corte do micado” [Griffis, 1911, p. ix]. Contudo, a Coreia foi para ele um interesse secundário em comparação ao Japão, tanto que jamais pisou na Terra da Manhã Tranquila e desconhecia o idioma coreano. Para escrever Coreia, a nação eremita, Griffis baseou-se em materiais traduzidos e uma considerável bibliografia em inglês, francês, alemão e japonês. Apesar do caráter de compilação, o livro foi bem-sucedido, com nove edições entre 1882 e 1911. Assim como fez com O império do micado, o autor manteve a obra atualizada nas reedições, adicionando novos capítulos que levam a narrativa além de 1882. A edição de 1911, última e mais completa, foi publicada apenas um ano antes do artigo em que Griffis denuncia a invenção estereotipada do oriental, o que leva a supor que suas ideias estavam aproximadamente no mesmo nível de maturidade ao escrever ambos os textos.

 

Por trás das declarações de isenção e imparcialidade do prefácio, o relato de Griffis tem lado definido: a favor do Japão, do imperialismo e da missão civilizadora. A integração da Coreia ao Japão seria para benefício mútuo: “no mundo moderno, Japão e Coreia são tão necessários um ao outro como homem e mulher” [Griffis, 1911, p. 513]. Ele argumenta que a única culpada da perda de independência da Coreia foi ela mesma, em decorrência de uma opção pelo isolamento, tradicionalismo, cultura chinesa e atraso:

 

“Não há nada de misterioso na perda da soberania coreana e sua absorção pelo Império Japonês. Uma análise de sua história e dos movimentos mundiais desde 1866 mostra inexoravelmente a lei da causa e consequência. Foi a fraqueza da Coreia estar não apenas isolada do mundo, mas em seu isolamento exagerar a importância da antiguidade a ponto de deixar a nação indefesa no choque moderno de civilizações, quando Oriente e Ocidente estão se encontrando para se fundir em uma sociedade mundial. A primeira enfermidade dos coreanos de mente insular vem do longo contato com a história e literatura chinesas. Embora estimulante para o intelecto, isso paralisou a iniciativa mental e sufocou a originalidade. Os coreanos imaginavam que a China era o começo e fim de toda a sabedoria. Acrescente-se a isso a ilusão de que um saber literário bastava para preservar a sociedade e a soberania nacional” [Griffis, 1911, p. 510].

 

Em geral Griffis reconhece a existência de distinções entre os coreanos, separando a nobreza governante yang-ban e o povo, opressores e oprimidos. Os verdadeiros vilões por trás da anexação da Coreia foram os yang-ban, despóticos e retrógrados, responsáveis pela situação precária do país:

 

“Com a Guerra Russo-Japonesa, a Coreia foi salva de se tornar uma província russa e o rei e a corte tiveram um momento supremo para reformas que, se executadas, trariam uma nova vida à nação. A Coreia teria permanecido um Estado soberano se o governante e as classes governantes estivessem à altura da oportunidade. Não era para ser. Com o despotismo no palácio e uma classe letrada atada a tradições rígidas, mas profundamente ignorante do mundo e da época, havia abaixo deles uma população oprimida, mergulhada na superstição, pela qual o governo nada fez. Na falta de uma classe média inteligente, a reforma na Coreia, exceto vinda de fora, talvez fosse moralmente impossível” [Griffis, 1911, p. 507].

 

Entre os nobres nocivos ao país, Griffis destaca o papel das mulheres, que responsabiliza por intrigas palacianas em detrimento do interesse coletivo. Culpa em particular a rainha Min por abrigar no palácio inúmeros parasitas que viviam às custas do povo - cabe mencionar a postura resolutamente anti-influência japonesa por parte da rainha, que levou ao seu assassinato em 1895 a mando do diplomata japonês Miura. Provavelmente o posicionamento político da rainha foi um fator relevante para moldar a opinião de Griffis, através da sua consulta a fontes japonesas. No Japão, ao contrário da Coreia, a alta política era assunto de homens, o que ele entende ser positivo: “no Japão, a posse de cargos por mulheres do palácio foi abolida. No palácio em Seul, sua influência podia anular em segredo os negócios públicos” [Griffis, 1911, p. 480].

 

A oposição entre elite yang-ban e povo era praticamente absoluta: ociosos x trabalhadores, arrogantes x dóceis, xenófobos x hospitaleiros, mentes fechadas x receptivos, letrados x ignorantes. Ao fazer o contraste entre o governo “mau” e a população “boa”, talvez o autor tivesse a intenção de isentar a maioria da responsabilidade pela decadência política, como que a dizer que os coreanos enquanto indivíduos eram melhores que a Coreia enquanto país. Contudo, um termo adicional da oposição complica o quadro: os yang-ban eram dotados de agência, enquanto o povo era passivo e capaz de se contentar com pouco. A elite poderia, se fosse menos cobiçosa e mais patriótica, ter mudado os rumos da Coreia. O povo, acostumado ao jugo da opressão, era incapaz de fazê-lo:

 

“As dificuldades no rumo da reforma eram estarrecedoras. Os obstáculos principais estavam nas duas classes de que a sociedade coreana é composta - opressores e oprimidos. Os yang-ban, ou privilegiados, com maior ou menor erudição chinesa, pareciam não ter noção de patriotismo que não o lucro. Seu atributo principal era o vampirismo político. Por outro lado, a atitude supina do povo comum, acostumado há séculos à opressão sistemática, era desanimadora. Para eles o governo decente, quer dizer, aquele que podia ser tolerado sem rebelião, significava a graça dos seus amos e governo sem roubos. Uma característica que chama a atenção em quase todas as cidades coreanas é as fileiras extensas de tabuletas de pedra ou ferro que celebram os méritos dos governadores ‘bons’, quer dizer, mais ou menos decentes” [Griffis, 1911, p. 515].

 

A exceção à passividade popular mostrou-se igualmente improdutiva. O relato condena com firmeza a resistência aos japoneses, mostrada como um ato de ignorância, quando não de banditismo puro e simples:

 

“Infelizmente, a Coreia de mentalidade medieval, como o Japão bárbaro de não tanto tempo atrás, buscou remédio para as supostas injustiças no assassinato. De maneira e pouco inteligente, recorreu-se a espadas e balas para deter o carro do progresso. Rápidos para julgar mal e impacientes para esperar resultados, os assassinos selecionaram como primeiras vítimas os melhores amigos do seu país. Os fracos e frustrados tentaram o suicídio como remédio e meio de dissuasão. Os insurgentes do chamado Exército Justo eram muito frequentemente assaltantes do seu próprio povo” [Griffis, 1911, p. 516].

 

O panorama traçado por Griffis de uma Coreia dividida entre nobreza parasita e povo subjugado acaba por justificar o imperialismo japonês em nome do bem dos próprios dominados. Se os coreanos fossem bons, a anexação seria moralmente injustificável. Se fossem maus, a missão civilizadora seria inútil. Griffis torna a intervenção estrangeira viável e aceitável, mesmo necessária, ao representar a sociedade coreana como dividida entre uma pequena minoria má e estagnada que oprime sem cessar e uma massa benevolente, mas que se submete quase que incondicionalmente aos governantes. Para modernizar a Coreia, os yang-ban precisavam ser afastados do poder porque, em seu tradicionalismo e egoísmo exacerbados, haviam se mostrado incapazes da tarefa. Tampouco o povo podia empreender a modernização sozinho, porque havia sido deformado pelo mau governo, ficando reduzido à docilidade ou a gestos fúteis de violência. Os coreanos não estavam habilitados a salvar o próprio país, logo, alguém de fora precisaria fazê-lo por eles. O célebre dito de Marx, adotado como epígrafe do Orientalismo de Said, aplica-se perfeitamente à população da Coreia descrita por Griffis: “eles não são capazes de representar a si mesmos, necessitando, portanto, ser representados” [Marx, 2011, p. 143].

 

O livro A nação eremita é, no que concerne à Coreia, orientalista no sentido saidiano do termo: o saber a serviço do poder, uma forma de exercício e constituição do poder, o saber-poder em que seus elementos estão emaranhados a ponto de não se distinguirem. Griffis tece um discurso que reduz os coreanos a dois grupos distintos, mas mais ou menos homogêneos, ambos incapazes de preservar a soberania nacional. Dessa forma, legitima aos leitores a ação imperialista do Japão.

 

O Japão descrito no relato tem características em comum tanto com a Coreia quanto com os países ocidentais. O Japão era a Coreia que deu certo, que enfrentou o atraso e ingressou definitivamente no mundo moderno, ou seja, adotou o modelo ocidental de civilização. A Coreia atual continuava a ser como o Japão de outrora, o que facilitava a tarefa dos japoneses ao torná-los ciente dos desafios que enfrentavam. Ao contrário dos yang-ban interesseiros e ociosos, a classe samurai japonesa havia renunciado às suas pensões hereditárias em nome do patriotismo e se empenhado em trabalho produtivo [Griffis, 1911, p. 498, 513]. Apenas para exemplificar o olhar idealizado de Griffis para o Japão, vale lembrar que a perda “voluntária” de privilégios legais e financeiros dos samurais envolveu cálculos políticos por parte dos envolvidos e coerção governamental, e que houve várias revoltas de samurais tradicionalistas e insatisfeitos na década de 1870, a mais famosa sendo a Rebelião de Satsuma, comandada por Saigô Takamori, anteriormente um dos líderes da Restauração Meiji [Vlastos, 1989, p. 382-402].

 

O ingresso na família das nações modernas dotou o Japão de grande força, à qual correspondia um senso de responsabilidade. Griffis explica as guerras contra a China (1894-1895) e Rússia (1904-1905) não por uma política de buscar a hegemonia regional, mas pelo bem do povo coreano. Por uma curiosa inversão de papéis, o ator decisivo na expansão eram os próprios conquistados, cuja fraqueza obrigava a ação conquistadora. No prefácio à edição de 1906, pouco após o término da Guerra Russo-Japonesa e estabelecimento do protetorado sobre a Coreia, o autor explica:

 

“A ascensão do Japão, em meio século de contato direto com o Ocidente, à posição de um Estado moderno, capaz de primeiro humilhar a China e depois lutar com sucesso contra a Rússia, afetou vitalmente a Coreia, por cuja independência o Japão pela segunda vez foi à guerra contra uma potência muito mais rica em recursos naturais” [Griffis, 1911, p. vii].

 

Griffis admite que houve aspectos negativos da presença japonesa, especialmente em duas situações: atos de brutalidade e espoliação cometidos por “uma horda de aventureiros insolentes de classe baixa” e excessos ao reprimir insurreições [Griffis, 1911, p. 499, 516-517]. Mas eram erros que não invalidavam o caráter progressista da nova administração em prol da qualidade de vida: construção de escolas, hospitais, portos, ferrovias, estradas e pontes, melhor aproveitamento da terra, sistema tributário justo, policiamento, reformas legais e, mais importante de tudo para o missionário, liberdade religiosa e possibilidades de expansão do cristianismo [Griffis, 1911, p. 518-520]. A nação eremita retrata o imperialismo japonês usando um artifício retórico comum aos impérios ao pressupor que a essência do império é boa e evidências em contrário não passam de erros, desvios ou atos isolados que mantêm a benevolência fundamental intacta; que qualquer brutalidade ou abuso pode ser minimizada com um apelo à essência de “quem nós somos” [Morefield, 2014].

 

A nação eremita destoa da condenação que Griffis fez à estereotipação do “oriental”, sem por isso ser uma obra orientalista típica. Coreia e Japão recebem tratamentos opostos: enquanto a Coreia é de fato estereotipada como um país retrógrado e incapaz de conduzir o próprio destino, o Japão é considerado moderno e progressista. O Japão de Griffis só tem de asiática a localização geográfica, sendo em quase todos os demais aspectos semelhante às potências ocidentais, inclusive no fardo de trazer as luzes aos povos atrasados, mesmo a malgrado destes. A exceção na ocidentalização narrativa do Japão é a fraqueza do cristianismo em solo nipônico, que leva a uma inversão momentânea dos termos: o autor espera que a liberdade religiosa implementada na Coreia faça prosperar ali a obra dos missionários e, uma vez convertida, a colônia possa trazer a salvação cristã à metrópole.

 

É uma questão pertinente, mas que escapa aos objetivos desta investigação, saber em que medida Griffis foi influenciado pela natureza das fontes que consultou e seu conhecimento linguístico, pois tinha acesso direto a obras japonesas, mas dependia de traduções para material coreano. É bastante provável que ele tenha adquirido parte da visão depreciativa da Coreia em textos “orientalizantes” de autores japoneses.

 

As descrições do livro refletem as relações de poder entre os dois países ao mesmo tempo que as reforçam, legitimando ao público leitor a perda de soberania coreana. O cristianismo, único fator importante em que o Japão não é equivalente aos países do Ocidente, acaba por se tornar um elemento justificador do expansionismo imperialista, dadas as perspectivas de evangelizar o império a partir da colônia. O discurso orientalista marca o texto, mas apenas no tratamento dado à Coreia. Para Griffis, que evita enxergar o Império Japonês sob a ótica do “perigo amarelo”, a modernização do Japão demonstra a possibilidade de um país passar de “oriental” a “ocidental”.

 

Da análise de Coreia, a nação eremita aqui realizada, constata-se que os conceitos de Said devem ser tratados com cautela antes de aplicados ao caso do Japão. Por outro lado, pode-se dizer que isso reforça a teoria exposta em Orientalismo; se o saber dos orientalistas estava intimamente ligado ao poder, é previsível que ele seria diferente em um país cujo poder permitia uma equiparação aos países ditos civilizados.

 

 

Referências

Emannuel Henrich Reichert é Doutor em História pela Universidade de Passo Fundo. Atualmente trabalha na Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão do Estado do Rio Grande do Sul.

 

DUUS, Peter. The abacus and the sword: the Japanese penetration of Korea, 1859-1910. Berkeley: University of California Press, 1995.

GRIFFIS, William Elliot. Corea, the hermit nation. 9. ed. New York: Charles Scribner´s Sons, 1911.

HIRAWAKA, Sukehiro. Japan´s turn to the west. In: JANSEN, Marius B. (ed.). The Cambridge History of Japan. Volume 5: The Nineteenth Century. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 432-498.

MARX, Karl. O 18 de brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011.

MOREFIELD, Jeanne. Empires without Imperialism: Anglo-American decline and the politics of deflection. New York: Oxford University Press, 2014.

OTA, Yuzo. William E. Griffis The Mikado´s Empire (1876). In: SAEKI, Shôichi; HAGA, Tôru (eds.). Masterpieces on Japan by Foreign Authors: From Goncharov to Pinguet. Singapore: Springer Nature, 2023, p. 17-20.

REICHERT, Emannuel Henrich. Griffis e a lenda do Oriental: Uma denúncia do Orientalismo antes de Said. In BUENO, André (org.). Mundos em Movimento: Orientalismo. Rio de Janeiro: Projeto Orientalismo/UERJ, 2021, p. 146-152.

VLASTOS, Stephen. Opposition movements in early Meiji, 1868-1885. In: JANSEN, Marius B. (ed.). The Cambridge History of Japan. Volume 5: The Nineteenth Century. Cambridge: Cambridge University Press, 1989, p. 367-431. 

4 comentários:

  1. Olá Emannuel! Muito interessante seu texto. Fiquei pensando que essa noção do isolamento coreano aparece em Doramas, especialmente aos que se dedicam ao passado imaginado. Esse discurso da ocidentalização do Oriente não acaba sendo reforçado agora nas análises da produção cultural coreana e seu impacto na cultura pop como um todo?
    Obrigada!
    Atenciosamente,
    Janaina de Paula do Espírito Santo

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    1. Olá, Janaína, pergunta intrigante! Acredito que existem pelo menos dois aspectos a considerar. Um é a "americanização" da Coreia (e Japão) durante a Guerra Fria. Os coreanos foram inseridos na geopolítica capitalista diretamente através da aliança com os Estados Unidos, sem que fosse promovida a aproximação com os países vizinhos (uma política de centro e eixos onde tudo se centralizava nos EUA, ao contrário, por exemplo, da integração realizada na Europa). Isso certamente promove a ocidentalização na medida em que o grande aliado é os Estados Unidos, enquanto os países vizinhos são ou ameaças em potencial (China, Coreia do Norte) ou, no máximo, aliados com muitas questões não resolvidas (caso do Japão). Outro aspecto é a promoção deliberada de uma cultura pop voltada para o mercado externo. No caso do Japão, que conheço um pouco melhor, fala-se em produtos "sem odor cultural", que são neutralizados de forma a não realçar os elementos japoneses "exóticos" para outros países. É possível que a indústria cultural coreana siga diretrizes semelhantes.

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  2. Caro Emmanuel, parabéns pelo texto! A partir do título do livro analisado, fico pensando se esses estereótipos orientalistas ainda não se projetam sobre análises mais recentes sobre a Coreia do Norte, por exemplo... essa ideia seria procedente?
    Saudações!
    André Bueno

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    1. Olá, André, me parece que sim! Sem entrar em juízos de valor sobre a política da Coreia do Norte, os estereótipos do Griffis em 1911 são muito parecidos com a noção de senso comum sobre a Coreia do Norte. Ditadura onde uma elite interesseira deixa o povo na miséria, apego a ideologias não ocidentais "esquisitas" (confucionismo/juche), isolacionismo que provoca o atraso porque o país não se beneficia do desenvolvimento trazido pela comunidade internacional: estereótipos de ontem e hoje. A Coreia do Sul é o contraste "positivo", o país onde tudo deu certo graças à modernização ocidentalizada. Talvez a grande "inovação" do estereótipo atual esteja em considerar a Coreia do Norte uma ameaça militar, papel que ninguém atribuía à Coreia cem anos atrás.

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