O PATRIARCADO COMO MOLA PROPULSORA DO SOFRIMENTO PSÍQUICO DAS MULHERES SUL-COREANAS: UMA BREVE ANÁLISE SOBRE O LIVRO 'KIM JIYOUNG, NASCIDA EM 1982', por Maria Eduarda Coelho

 

Introdução

“O mundo tinha mudado bastante, mas não pequenas regras, contratos e costumes, o que significava que na verdade o mundo não tinha mudado nada.” - (CHO, p. 101, 2022)

 

Escrito pela ex-roteirista sul-coreana Cho Nam-joo, e baseado em suas experiências pessoais enquanto mulher na Coreia do Sul, Kim Jiyoung, nascida em 1982 expõe diversos tipos de violência as quais as mulheres são submetidas da infância à adultez a partir da vivência da personagem Kim Jiyoung. A obra fomentou discussões acerca de discriminação de gênero e desigualdade no país, além de ter sido aclamado globalmente, vendendo mais de um milhão de cópias. Assim, o presente artigo tem como objetivo analisar o impacto do patriarcado no adoecimento psíquico das mulheres sul-coreanas a partir da obra literária Kim Jiyoung, nascida em 1982.

 

Inicialmente, é necessário observar o contexto socioeconômico da Coreia do Sul, uma vez que o ser humano é biopsicossocial, sofrendo influências do meio e internamente as transforma conforme seu próprio funcionamento biológico e psicológico (BELLOCH; OLABARIA, 1993). Assim, aponta-se que o modelo de funcionamento econômico da Coreia do Sul é atravessado pelo Confucionismo, o qual está presente em diferentes níveis em sua cultura, desde o âmbito pessoal ao profissional (LEE, 2012). Isso significa dizer que, como defende o estilo de vida confucionista, todas as relações são pautadas em hierarquia, dever e lealdade. Às mulheres lhes é delegada a função de cuidar da família e da casa, permanecendo dependentes do marido, uma vez que são consideradas inferiores aos homens (SILVA, CARVALHO, 2021). Esse pensamento é raiz do machismo atualmente disseminado no país e causador de extremo sofrimento psíquico nas mulheres, uma vez que o modelo confucionista defende a priorização das necessidades familiares em detrimento de vontades e desejos individuais (LEE, et al., 2014) como é mostrado no livro Kim Jiyoung Nascida em 1982, no qual a personagem principal, diante da repressão  sofrida enquanto mulher ao longo de toda sua vida, desenvolve sintomas aparentemente dissociativos. Ela fala com a voz de outras mulheres de sua vida, vivas ou mortas, e também em terceira pessoa como no excerto abaixo:

 

“Quando estava quase terminando uma lata, Jiyoung deu um tapinha no ombro do marido e disse, bruscamente:

— Ei, Jiyoung está passando por um momento difícil. Cuidar de um bebê é muito desgastante. Sempre que puder, você deveria dizer a ela: Você está se saindo muito bem! Está se esforçando tanto! Reconheço seu esforço!” (CHO, pág. 9, 2022)

 

Preferência pelo filho homem

No livro, constantemente enfatiza-se que Jiyoung não é a única a sofrer com a misoginia e, devido ao seu caráter estrutural dentro da sociedade, as próprias mulheres também podem reproduzir discursos e comportamentos misóginos, pois como defende Gregori (1993, p.166), “[...] é possível constatar que as mulheres, muitas vezes inclusive por medo, reproduzem e reforçam os papéis de gênero, cooperando na produção de sua falta de autonomia, com o objetivo de obtenção de proteção e prazer”. Isso pode ser observado na relação entre a mãe e a avó paterna de Jiyoung ao pressioná-la, ainda que não maliciosamente, a dar à luz a um menino:

 

“Considerando a vida que tinha levado e relativamente carinhosa com a nora,

comparada a outras sogras de sua geração, ela dizia do fundo do coração, pelo bem

da nora:

— Você deveria ter um filho. Você precisa ter um filho. Você precisa ter pelo menos dois filhos...

Quando Kim Eunyoung nasceu, Oh Misook segurou a criança nos braços e chorou.

— Sinto muito, mãe — disse, de cabeça baixa.

Koh Boonsoon respondeu à nora, com carinho:

— Tudo bem. O segundo vai ser um menino.

Quando Kim Jiyoung nasceu, Oh Misook segurou a criança nos braços e chorou.

— Sinto muito, garotinha — disse, de cabeça baixa.

Koh Boonsoon repetiu com carinho:

— Tudo bem. O terceiro vai ser um menino.” (CHO, p.19, 2022)

 

O tão aguardado nascimento do irmão mais novo de Jiyoung gera um favoritismo da família, especialmente por parte da avó, e, apesar de conspícuo para os leitores, não é percebido ou questionado pela personagem, dado à sua naturalização dentro da sociedade coreana, uma vez que filhos do sexo masculino são tidos como mais produtivos do que filhas do sexo feminino e a eles lhes é creditado o papel de dar seguimento ao legado da família, além de prove-la financeiramente (EDLUND; LEE, 2013).

 

“O irmão tinha pauzinhos, meias, ceroulas e mochila e lancheira que combinavam, enquanto as garotas se contentavam com o que houvesse de disponível. Se havia dois guarda-chuvas, as garotas dividiam. Se havia dois cobertores, as garotas dividiam. Se havia dois doces, as garotas dividiam. Na infância, não ocorreu a Jiyoung que o irmão estivesse recebendo tratamento especial, portanto ela nem tinha ciúme. Sempre fora assim.” (CHO, p.17, 2022)

 

Desigualdade salarial entre gêneros no mercado de trabalho sul-coreano

Outro ponto a ser tratado neste artigo diz respeito ao contexto de Jiyoung enquanto mulher inserida no mercado de trabalho sul-coreano. Em dado momento, a ela lhe foi delegada uma tarefa de planejamento junto a uma equipe majoritariamente masculina e ela descobre que está sendo injustiçada e quase não figurou na equipe, pois o chefe não queria contratar mulheres, uma vez que, em sua visão, os homens eram mais comprometidos e traziam mais segurança na execução de projetos.

 

“Ela também descobriu que os caras ganhavam mais desde o início, mas essa informação teve muito pouco impacto em Jiyoung, que já tinha preenchido sua cota diária de choque e decepção. Ela não estava certa de que seria capaz de seguir o exemplo da gerência e dos funcionários mais antigos e confiar que se dedicar era a resposta, mas, quando a manhã chegou e o efeito do álcool passou, ela foi para o escritório como era de hábito. Encarou como sempre as tarefas que lhe deram. Mas a motivação e a confiança com certeza estavam abaladas.

A disparidade salarial na Coreia é a mais alta entre as nações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. De acordo com dados de 2014, as mulheres trabalhadoras da Coreia ganham só 63% do que os homens ganham; a média da OCDE é de 84%.12 A Coreia também é o pior país para as mulheres trabalhadoras, tendo alcançado as piores pontuações entre as nações analisadas pelo índice teto de vidro da revista britânica The Economist.” (CHO, p. 96, 2022)

 

A autora traz dados estatísticos várias vezes ao longo da obra, reiterando sempre que, apesar de personagens e elementos fictícios, a sua intenção é explanar a verdadeira realidade da grande maioria das mulheres sul-coreanas. O dado, mencionado na citação acima, da revista The Economist, é datado de 2016, e foi atualizado em 2018, porém a Coreia do Sul ainda figura como pior país para as mulheres trabalharem.

 

A problemática das câmeras espiãs

Há, ainda, retratado no livro, questões envolvendo assédio moral e sexual no ambiente do trabalho. Em Kim Jiyoung, no banheiro feminino do local de trabalho da personagem foram implantadas câmeras escondidas por um segurança a fim de espionar as mulheres, compartilhar com outros colegas de trabalho e expor suas imagens íntimas em sites de pornografia. Isso acontece porque a indústria pornográfica é altamente lucrativa, além de oportunista ao ser fomentada pela desigualdade de gênero, e a Lei falha em conceber medidas eficientes para prevenir e agir de forma corretiva quando essa violência acontece (TESHOME, 2019). De acordo com o departamento de pesquisa da Statista, só em 2021, 5.541 crimes relacionados às chamadas câmeras espiãs foram reportados na Coreia do Sul.

 

Além disso, a colega de Jiyoung fala sobre como isso comprometeu a sua saúde mental e a de outras colegas igualmente vítimas da situação:

 

“— Na verdade, estou fazendo terapia — comentou Hyesu. — Isso está me enlouquecendo. Embora eu finja que estou bem, rindo alto com as pessoas, parece que o mundo inteiro me reconhece daquelas fotos. Até um contato visual aleatório com um estranho me faz pensar se aquela pessoa viu minhas fotos e, quando alguém sorri, penso que essa pessoa está zombando de mim. A maioria das mulheres do escritório está tomando remédio ou fazendo terapia. Jungeun teve uma overdose de remédios para dormir e precisou fazer uma lavagem estomacal. Algumas pessoas pediram demissão: duas mulheres do Departamento de Assuntos Gerais, Choi Hyeji e Park Seonyoung, as supervisoras.” (CHO, p. 120, 2022)

 

A fala de Hyesu representa um avanço para cidadãos coreanos em busca de suporte psicológico, pois muitos suprimem os seus sentimentos e evitam adereçar questões de sofrimento psíquico ou transtornos psicológicos, pois é considerado um grande estigma no país, especialmente a depressão, a qual pode ser considerada socialmente como fonte de vergonha (LEE, et al.,2014). Muitos coreanos, sem nenhum tipo de válvula de escape ou acompanhamento psicológico e psiquiátrico, acabam somatizando as suas questões psíquicas. Dentro da Gestalt-Terapia, uma abordagem da Psicologia, a qual considera a totalidade do indivíduo, compreende-se que esse controle emocional exacerbado não impede o seu sentimento na dimensão corpórea, pois mente e corpo se integram, assim, entrar em contato com a dor permite elaborá-la melhor e não tornar-se refém dela (CHAVES, 2006). Ademais, referindo-se especificamente à saúde mental das mulheres coreanas tem-se que:

 

“De acordo com Pang, quando mulheres coreanas experienciam eventos trágicos ou traumáticos (problemas de vida intoleráveis), elas costumam experienciar altos níveis de distresse emocional. Ao invés de processar estas emoções apropriadamente, porém, elas se obrigam a suprimir reações emocionais negativas como raiva, ódio, frustração (internalização) [...].” (LEE; WACHHOLTZ, p.49, 2014)

 

Saída do mercado de trabalho para cuidar dos filhos e desvalorização do trabalho doméstico

“No fim, eles concluíram que um deles teria de ficar em casa e que essa pessoa, é claro, era Jiyoung. O emprego de Daehyun era mais estável e pagava melhor, mas, além disso, era mais comum que os maridos trabalhassem e as esposas criassem os filhos e cuidassem da casa.” (CHO, p.110, 2022)

 

“Jiyoung sabia que o apoio de Daehyun era sincero, mas ainda assim não conseguiu esconder a raiva.

— Ajudar? Que história é essa de ajudar? Você vai “ajudar” com as tarefas de casa. “Ajudar” na criação da nossa filha. “Ajudar” a encontrar outro trabalho. Não é sua casa também? Seu lar? Sua filha? E se eu trabalho, você também não gasta meu salário? Por que você fica repetindo que vai “ajudar”, como se estivesse se oferecendo para colaborar com o trabalho de outra pessoa?” (CHO, p. 111, 2022)

 

“Em 2014, quando Kim Jiyoung saiu da empresa, uma em cada cinco mulheres casadas pediam demissão na Coreia por motivos de casamento, gravidez, parto e para cuidar dos filhos ou educá-los. A taxa de participação de mulheres na força de trabalho cai significativamente antes e após o parto. A porcentagem parte de 63,8% para mulheres entre vinte e vinte e nove anos, cai para 58% para mulheres entre trinta e trinta e nove anos e volta a subir para 66,7% para mulheres com mais de quarenta anos.”  (CHO, p. 112, 2022)

 

Após o seu casamento, Jiyoung enfrenta cobranças da família do marido para ter um filho e ele sugere que eles o tenham o mais rápido possível a fim de acabar com a pressão familiar. Após uma discussão muito angustiante para a protagonista, ela resolve concordar e acaba deixando o emprego para dedicar-se à maternidade, pois acabaria tendo que conciliar os dois já que pesquisas apontam que mães trabalhadoras passam mais tempo cuidando de seus filhos do que pais trabalhadores (HWANG; SHIN, 2023). Outrossim, observa-se ao longo do livro as consequências enfrentadas por Jiyoung ao optar pela maternidade e demissão de seu emprego. Ela acaba sofrendo com julgamentos alheios, bem como com o cansaço físico, emocional e psicológico advindos do cuidado em tempo integral de uma criança e de afazeres domésticos.

 

“Jiwon chorava dia e noite até que a pegassem no colo, e Jiyoung tinha de cuidar da casa, ir ao banheiro e cochilar enquanto a segurava. Amamentando de duas em duas horas e, portanto, incapaz de dormir muito, ela limpava a casa com mais afinco do que antes, lavava as roupas e os paninhos da bebê, se alimentava bem para produzir leite suficiente e chorava muito mais do que havia chorado a vida inteira. Acima de tudo, todo seu corpo doía. Ela não conseguia mexer os punhos.” (CHO, p. 114, 2022)

 

Diante do abalo da saúde mental de Jiyoung, o qual antecede o seu comportamento dissociativo, infere-se que, de acordo com dados coletados por Hwang e Shin (2023), ser uma mulher coreana de 30 anos, faixa etária da personagem nessa fase, possui associação considerável a níveis altos de depressão do que em qualquer outra idade e, levando em consideração que isso prevalece especificamente em mulheres casadas, subentende-se o impacto dos papéis de gêneros desempenhados dentro da família na saúde mental dessas mulheres. Tudo isso é observado facilmente em Kim Jiyoung e pode ter contribuído para o seu desgaste emocional e psicológico.

 

A maternidade está sujeita à romantização, sendo considerada uma benção divina a qual as mulheres devem ser gratas e devotas, muitas vezes, não havendo espaço para queixas ou explicações nas mais diversas etapas, seja nas fases de gestação, puerpério ou criação da criança em si, impedindo o contato e elaboração subjetiva dos diversos sentimentos e pensamentos implicados nesses processos (CARVALHO, 2023). Existem muitas fantasias em torno disso, colocando a mulher numa posição na qual é obrigada a aceitar e cumprir a função materna juntamente à doméstica passivamente, estando sujeita à culpa caso expresse suas dores ou descontentamentos (BERNARDES; LOURES; ANDRADE, 2019), como é imposto à Jiyoung no livro. Ela expressa sua frustração ao marido, mas em seguida sente-se terrivelmente culpada por isso e o pede desculpas. As pessoas ao seu redor e até mesmo desconhecidos acrescentam à sua carga de culpa constantemente ao afirmarem que sua vida é fácil, pois não trabalha fora de casa, apenas cuida dos afazeres domésticos e da filha. Assim, o é também no mundo real.

 

Considerações Finais

Logo, diante do que foi discutido, é importante salientar que o livro Kim Jiyoung, nascida em 1982 aborda uma série de questões extremamente pertinentes sobre o impacto micro e macro do patriarcado, não apenas na vida de mulheres sul-coreanas como na de mulheres do mundo todo. Isso porque muitas das violências retratadas são experienciadas globalmente, sendo diferenciadas apenas em aspectos culturais específicos de cada país, e, por se tratarem de temas muito complexos, não foram passíveis de serem completamente desenvolvidos neste artigo, tampouco este era seu objetivo. Mais do que nunca, deve-se ampliar a discussão sobre papéis de gênero e misoginia em sociedade, para além do ambiente acadêmico a fim de buscar-se a diminuição das opressões cotidianas as quais são responsáveis por tolher a subjetividade feminina e violentar seus corpos.

 

Referências

Maria Eduarda Coelho é discente do décimo período do curso de Psicologia pelo Centro Universitário Frassinetti do Recife (UNIFAFIRE), pesquisadora do Núcleo de Pesquisa da UNIFAFIRE e associada à Curadoria de Estudos Coreanos da Coordenadoria de Estudos da Ásia (CEÁSIA) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

 

BELLOCH, A.; OLABARRIA, B. El modelo bio-psico-social: un marco de referencia necesario para el psicólogo clínico. Revista Clinica e Salud, v. 4, n. 2, p. 181-190, 1993.

 

BERNARDES, Ruane; LOURES, Amanda Freitas; ANDRADE, Barbara Batista Silveira. A romantização da maternidade e a culpabilização da mulher. Revista Mosaico, v. 10, n. 2Sup, p. 68-75, 2019.

CARVALHO, Mariana Correia Lacerda. O impacto das transformações da maternidade para a saúde mental da mulher, a luz da Gestalt-terapia. 2023.

 

CHAVES, Renata Beviláqua. Produzir enfermidades: um estudo de caso sobre a sintomatologia psicossomática na perspectiva da Gestalt-terapia. 2006.

CHO, Nam-Joo. Kim Jiyoung, nascida em 1982. 1ª Edição. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2022.

 

EDLUND, Lena; LEE, Chulhee. Son preference, sex selection and economic development: The case of South Korea. National Bureau of Economic Research, 2013.

 

GREGORI, Maria Filomena. Cenas e queixas: um estudo sobre mulheres, relações violentas e a prática feminista. São Paulo: ANPOCS, 1993.

 

HWANG, Sunoong; SHIN, Heeju. Gender Gap in Mental Health during the COVID-19 Pandemic in South Korea: A Decomposition Analysis. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 20, n. 3, p. 2250, 2023. Disponível em: https://www.mdpi.com/1660-4601/20/3/2250

 

KOSIS. “Number of Spycam Related Crimes in South Korea from 2011 to 2020 According to Korean National Police Agency.” Statista, 2021. Disponível em: https://www.statista.com/statistics/1133121/south-korea-number-of-spycamcrimes.

 

LEE, Choong Y. Korean culture and its influence on business practice in South Korea. The Journal of International Management Studies, v. 7, n. 2, p. 184-191, 2012.

 

LEE, Jieun; WACHHOLTZ, Amy; CHOI, Keum-Hyeong. A review of the Korean cultural syndrome Hwa-Byung: Suggestions for theory and intervention. Asia T'aep'yongyang sangdam yon'gu, v. 4, n. 1, p. 49, 2014.

 

LEE, Sang-Hyuk et al. Long-standing depression and anxiety in a Korean woman. American Journal of Psychiatry, v. 171, n. 6, p. 622-624, 2014. Disponível em: https://ajp.psychiatryonline.org/doi/full/10.1176/appi.ajp.2013.13111469.

 

TESHOME, Birru Dereje. Spy camera epidemic in Korea: A situational analysis. Asian Journal of Sociological Research, p. 1-13, 2019.

 

The Best and Worst Places to Be a Working Woman. The Economist, 2018.

13 comentários:

  1. Maria Eduarda, a análise do livro em questão, nos remete a pensar o papel da mulher na sociedade brasileira, que ainda hoje é permeado pelas questões de procriação e casamento. Percebo que diferente das mulheres sul-coreanas no Brasil estamos ganhando voz e coragem para denunciar, lutar por direitos e estabelecer limites dentro das relações pessoas e criação de filhos. Dito isso, minha dúvida parte da criticidade social àquela mulher que opta por não se casar e nem ter filhos, como fica sua "imagem" dentro do grupo social? Sua vida profissional é afetada por essa decisão?

    At.te.: Lidiane Álvares Mendes

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    1. Lidiane, na verdade, o movimento feminista na Coreia do Sul vem ganhando força nos últimos tempos e com ele, naturalmente, a luta por equidade e direitos das mulheres. O interessante é que essas mulheres cada vez mais expressam o desejo de não casar e de não ter filhos. Isso, claro, tem muita relação com o alto custo de vida do país, o qual tem crescido cada vez mais, mas não deixa de ser uma forma de protesto também muito encorajada dentro do movimento. Resultado disso é que hoje a Coreia do Sul é o país com a taxa de natalidade mais baixa do mundo. Assim, as mulheres que optam por fugirem ao "padrão" de casar e ter filhos enfrentam julgamentos e podem ser tidas como solitárias, dignas de pena ou problemáticas. E isso costuma se aplicar inclusive a pessoas solteiras em geral, pois a Coreia do Sul possui uma cultura de "casal"; estar em um relacionamento configura-se como um status social. Quanto à vida profissional, não tenho dados concretos, mas pelo que li a respeito, creio que as beneficiem, pois possuem mais tempo para se dedicar ao trabalho. As empresas inclusive não gostam de contratar mulheres casadas, pois isso pode significar para os contratantes que mais pra frente terão filhos e pedirão licença-maternidade para se ausentar, gerando prejuízo. Creio que essa matéria pode elucidar melhor essa questão: https://www.theguardian.com/world/2022/feb/05/happy-alone-the-young-south-koreans-embracing-single-life

      E, parando para pensar, não é tão diferente da nossa realidade no Brasil. Afinal, quantas vezes já não vimos ou ouvimos uma mulher sendo recebida com estranhamento por outras pessoas quando decide não casar ou ter filhos?

      Espero ter respondido a sua pergunta.

      Att.: Maria Eduarda Coelho Santos

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    2. Olá, Maria Eduarda...respondeu a contento, muito obrigada pela resposta e sugestão de leitura!
      At.te.: Lidiane Álvares Mendes

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  2. Olá Maria, adorei o seu texto! Já faz um tempo que queria comprar o livro Kim Jiyoung, nascida em 1982 e agora quero ainda mais.
    Minha pergunta é: você sabe dizer se o confucionismo ainda é muito difundido na Coréia do Sul atualmente? Sei que o pensamento confucionista ainda é bastante enraizado no país, mas as gerações atuais ainda se envolvem muito na doutrina confucionista?

    Atenciosamente, Camilly Evelyn Oliveira Maciel

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    1. Olá, Camily! Muito obrigada! O Confucionismo enquanto doutrina filosófica não mais é disseminada na Coreia do Sul como no passado, ainda que, como você bem pontuou, está fortemente enraizado na cultura do país, a exemplo de seu rigoroso sistema hierárquico. Tal sistema está presente nas relações sociais como um todo (família, amigos, trabalho, etc.), e, inclusive, na língua coreana a partir do uso de variados níveis de formalidade no discurso a depender da diferença de idade, ocupação ou experiência.
      Portanto, de uma certa forma, as gerações atuais estão envolvidas nesse contexto, pois trata-se de algo que é parte do ambiente no qual estão inseridas. Contudo, com a globalização e abertura gradativa da Coreia à exposição de novas ideias, os jovens imprimem sua própria marca na nova geração, a exemplo da ascensão do movimento feminista sul-coreano, o qual vai de encontro aos valores patriarcais confucionistas.

      Espero ter respondido a sua pergunta.

      Att.: Maria Eduarda Coelho Santos

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  3. Cara Maria Eduarda, tudo bem? Primeiramente gostaria de parabenizar pelo seu texto, está muito bem escrito e as críticas são bastante precisas. Eu fiz a leitura do livro Kim Jiyoung, nascida em 1982 em fevereiro desse ano, e devo dizer que todos os pontos que você ressaltou no texto também foram os principais destaques do livro para mim. O meu interesse pelo livro partiu quando a cantora de K-pop do grupo Red Velvet Irene foi alvo de polêmica ao aparecer numa foto segurando esse livro. O fervor na internet por parte do público masculino sul-coreano foi de imediato, desde a queima de álbuns do Red Velvet e também de fotos da cantora. Para mim, essa reação violenta por parte dos homens sul-coreanos ilustram muito bem a crítica que a autora Cho Nam-Joo quis repassar no seu livro, lembrando também que a própria Irene é uma mulher na casa dos seus 30 anos, solteira, bem-sucedida e independente. Com isso, gostaria de saber se você chegou a ficar sabendo desse caso, e de como você tomou conhecimento do livro da Choo. Muito obrigada!

    Marcela Langer

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    1. Olá, Marcela! Tudo ótimo e com você? Muitíssimo obrigada pelo seu feedback e pela pergunta! Tive conhecimento desse caso com a Irene, sim, lembro bem quando aconteceu na época e concordo com o que você disse. Achei inclusive extremamente necessário e corajoso o ato dela de divulgar o livro de certa forma. Como é muito bem difundido nas mídias sociais, existe muita misoginia na indústria de entretenimento de forma geral e na coreana não poderia ser diferente, pois é apenas um reflexo da sociedade. Dada à influência que possuem os 'idols', a propagação de conteúdos feministas que colocam em pauta questões sociais é muito bem-vinda, estimulando reflexões, tomada de consciência e criando possibilidade de mudança.
      Não lembro ao certo em que momento ouvi falar do livro da Cho Nam-joo... talvez nessa época. Participei de um clube de livro de literatura coreana ano passado e tomei gosto, então fui atrás de mais obras. Li Kim Jiyoung, nascida em 1982 em janeiro após ganha-lo de presente e foi uma leitura extremamente rica. Acho que todos deveriam lê-lo!

      Att.: Maria Eduarda Coelho Santos

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  4. Ola, sou a Jorciane M. Campos. Li seu artigo e o livro Kim Jiyoung, nascida em 1982 esse ano, uma leitura que me impactou muito. Também acabei lendo por causa da polemica da cantora que a Marcela acima comentou. Já estava na minha lista, mas sempre enrolava, com a polemica tive coragem e li. Foi um choque, já sabia de grande parte do machismo estrutural coreano, mas o livro dá uma visão bem mais 'metódica' por assim dizer, principalmente desde crianças favorecendo o irmão, e até da mãe dela focar a renda dela nos estudos dos homens da família. Recentemente saiu uma noticia sobre o filme da Barbie não ter sido bem recebido na Coreia do Sul e entre os motivos elencados, eram que o filme era muito feminista, e se as mulheres fossem vistas indo ver o filme seriam taxadas de feministas e não queriam ou seus homens não permitiram ir. Na hora fiquei abismada, e gostaria de saber se sabe mais sobre os movimentos feministas coreanos ou onde ler mais sobre eles?
    (link da reportagem: https://revistakoreain.com.br/2023/08/midia-ouve-opinioes-sobre-os-baixos-numeros-de-barbie-nas-bilheterias-da-coreia-do-sul/)

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    1. Olá, Jorciane! Agradeço a pergunta. Ainda não havia lido sobre a repercussão do filme da Barbie lá, mas não me surpreendo para ser sincera; de fato a misoginia é alarmante. Quanto ao movimento feminista da Coreia do Sul, entendo que ele é responsável por uma mudança de perspectiva e uma série de protestos lá, reivindicando os direitos das mulheres. Existe um movimento crescente de evitar se relacionar com homens ou simplesmente não se casar, etc. Posso indicar como leitura essas matérias, mas acredito que há muitas outras interessantes sobre o assunto: https://diplomatique.org.br/a-revolta-das-sul-coreanas/ | https://www.thecut.com/2023/03/4b-movement-feminism-south-korea.html

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  5. Olá, Maria Eduarda Coelho! Primeiramente, parabéns pelo texto! Muito bem escrito e com o uso interessante da fonte, que retrata bem a condição de uma mulher média na sociedade sul-coreana diante do patriarcado presente nesta sociedade. Considerando que a condição da mulher em uma sociedade é atravessada por questões também de classe, raça e sexualidade (além do próprio gênero), questionamos: ao longo da obra e de acordo com suas pesquisas você pode identificar a condição de mulheres em diferentes classes sociais da sociedade coreana no período narrado? Isto é, há o retrato de diferentes papéis assumidos socialmente, e em termos trabalhistas, por mulheres (especialmente quando tornam-se mães) de acordo com a classe?

    Ass.: Hannah Cabral Dantas de Barros Teixeira e Allyson Afonso dos Santos Silva.

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    1. Olá, Hannah e Allyson! Muito obrigada pelo feedback e pela pergunta! Acredito que o livro aborda na maior parte as mulheres de classe média, mas com exemplos interessantes de classes sociais menos desfavorecidas como a mãe e a avó de Jiyoung. A mãe da personagem trabalhou junto com a sua irmã para assegurar que os irmãos homens tivessem condições financeiras de se formarem na universidade e posteriormente conseguirem o que eram considerados bons empregos, enquanto elas próprias não tiveram essa oportunidade tampouco suporte familiar ou de qualquer outro tipo. Essa prática era inclusive muito comum, refere-se ao que falei sobre o favoritismo do filho ou filhos homens nas famílias, que era extremamente marcante nas gerações anteriores. Quanto à avó de Jiyoung, ela sustentou os filhos sozinhos e cuidou da casa porque o marido não fazia nada e, mesmo assim, não reclamava, pois achava que ele era um bom marido só porque não a agredia de nenhuma forma. Tudo isso num contexto de guerra e escassez, pois subentende-se que aquela era a época da Guerra das Coreias, como traz o excerto abaixo:
      "Os quatro irmãos nasceram e foram criados em uma época na qual
      a própria sobrevivência era uma luta. Enquanto as pessoas morriam
      — tanto jovens quanto velhos — devido a guerra, doença e fome, Koh
      Boonsoon cultivava os campos de outras pessoas, vendia mercadorias
      de outras pessoas, fazia o trabalho doméstico de outras pessoas e
      ainda conseguia cuidar da própria casa, lutando com unhas e dentes
      para criar os quatro meninos. O marido, um homem de pele clara e
      mãos macias, nunca trabalhou. Koh Boonsoon não se ressentia do
      marido por não ter a capacidade ou a vontade de sustentar a família.
      Ela acreditava piamente que ele era um marido decente por não se
      deitar com outras mulheres e não bater nela. Dos quatro filhos que
      criou assim, o pai de Jiyoung foi o único que cuidou da mãe quando
      ela envelheceu." (CHO, Namjoo. p.18)
      Então, acredito que sim, conseguimos observar um pouco do peso que esse marcador social possuiu e possui para essas mulheres, dificultando a busca por uma boa qualidade de vida.

      Espero ter respondido a pergunta. Esta de fato é uma questão extensa e importantíssima, a qual exige mais tempo de pesquisa e discussão!

      Att.: Maria Eduarda Coelho Santos

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